ORDEM E
PROGRESSO
Coletivo mulheres
de buço – Rio de Janeiro/RJ
A cena, como o próprio grupo
afirma na proposta de encenação, propõe “(...) reflexões críticas acerca da
concepção iluminista da razão: um sistema de pensamento que determina o certo e
o errado e condena quem pensa diferente – capazes e incapazes de fazer parte do
convívio social”.
A ideia e a iniciativa, sem
dúvida, são excelentes, principalmente no atual momento em que vivemos, após
eleições e depois de pouco mais de um ano dos movimentos populares. Mas há que
se apontar alguns entraves na cena que atrapalharam um pouco a genuína vontade
do grupo de botar pra fora seus incômodos e sua vontade de expressão.
Nesse sentido, acredito que o
texto possa ser melhor trabalhado. Apesar das ótimas referências (o conto de
João do Rio “O homem da cabeça de papelão” e os filmes “Minority Report” e
“Doze homens e uma sentença”), a dramaturgia carece principalmente de mais
clareza e carpintaria. Creio que uma construção mais dramática poderia surtir
mais efeito: personagens mais definidos, linha narrativa mais clara e,
principalmente, explorar mais o conflito do texto, que é a descoberta de que um
dos “juízes” é também um dos condenados. Isso permitiria um melhor rendimento
do trabalho das atrizes. Apesar de nitidamente dispostas e com recursos
técnicos vocais bem trabalhados, a falta de contracenação – devido ao texto
incipiente – atrapalha um melhor resultado.
A transposição da narrativa épica
para a dramática é sempre delicada, pois no teatro grande parte do interesse do
público se dá através da sua relação com o conflito proposto. No teatro dito
realista – ou numa prática que se pretende contar uma história – isso vem
diretamente do texto. E a impressão que me fica é que há uma indefinição na
escolha do grupo: contar bem uma história ou botar pra fora um discurso mais
áspero sobre a temática escolhida? Talvez um caminho para esse empasse seria a
presença de um dramaturgo de ofício – no sentido de ter alguém de fora para
processar melhor o material criado colaborativamente.
Por outro lado, a direção e a
visualidade do espetáculo trabalham juntas em sintonia, proporcionando uma
dinâmica ágil e prazerosa de se ver. O que parece revelar uma preocupação do
grupo com a estética da cena. Um cuidado maior com a dramaturgia, unindo a
visualidade da cena e o discurso do grupo, resultaria num trabalho ainda mais
potente.
A encenação também chama atenção
pelo áurea cinematográfica impressa na cena. Um “timing” preciso, uma
disposição mais frontal e a imposição total da “quarta parede” mostram
claramente o diálogo já mencionado com as referências do cinema.
Por fim, acho que um trabalho
extremamente digno, engajado, com seus integrantes repletos de energia e
disposição, mas que, por enquanto, ainda falta clareza do discurso e um melhor
tratamento dramatúrgico.
Diego Molina (panodefundo@gmail.com)
Rio de Janeiro, 12 de novembro de 2014 – 7º Festival Niterói em Cena
***
DENUNCIADOS PELA LINGUAGEM
Belo Horizonte/MG
O esquete começa com um ator, da
plateia, representando um morador de rua, enquanto outros dois atores, no
palco, montam o cenário do que virá a ser um bar. A realização de cenas
simultâneas e de falas sobrepostas acontece durante todo o esquete e chama
bastante a atenção, positivamente. Um trabalho que me faz lembrar as peças do
encenador Jefferson Miranda, que, através de conversas aparentemente cotidianas
dentro uma plataforma aparentemente naturalista, traz à tona interessantes
questões sobre o ser humano.
A premissa do grupo de
“Denunciados pela linguagem” tenta seguir um caminho parecido. Mas durante todo
o esquete tentei captar qual seria a “questão” do trabalho. A presença de um
personagem que é um morador de rua e de uma família que trabalha num bar,
aparentemente de uma periferia, indicam ricos caminhos para a reflexão de nossa
sociedade. No entanto, não há um “discurso” claro, nem um problema evidente a
ser resolvido, dramaticamente falando. O grupo subverte o conceito de ação
dramática para deixar seus personagens “serem” no palco: sua existência e seu
contato com os outros personagens, dentro de uma plataforma social bem definida
(bar da periferia) seria o suficiente para o desenvolvimento do esquete e
consequentemente das reflexões que dela pudessem surgir.
Tudo isso acaba criando uma
estrutura muito próxima do “real”: tempo, falta de ação, diálogos cotidianos
etc. O que é bastante prazeroso de acompanhar. E em contraposição a essa
proposta, a direção cria um ambiente altamente volúvel e teatral utilizando-se
de engradados de cerveja, que são trabalhados de diversas formas,
possibilitando dinâmicas variadas. A instabilidade das caixas quando empilhadas
ainda permite criar uma tensão com o público, visto que podem cair ou se
desencaixar a qualquer momento.
Mas ao término do esquete, ainda
não era possível entender qual era a “questão”, de fato, em cena. Lendo a
proposta de enação fiquei encantado com as referências trabalhadas pelo grupo,
em particular o caso real da mulher linchada no litoral paulista após ter sido
acusada de bruxaria com crianças. Infelizmente, não consegui identificar com
clareza as referências na cena, me deixando com uma sensação um pouco
frustrada.
O trabalho dos atores tem papel
de destaque no esquete: ao mesmo tempo em que atuavam bem dentro da estrutura
“cotidiana” proposta pelos diálogos, também quebravam com vigor esse ambiente,
com bons rompantes de teatralidade.
Destaco ainda o momento em que a
criança destrói o boneco. Uma cena extremamente forte e ao mesmo tempo
delicada. Sem dúvida o melhor momento do trabalho.
Ao final de tudo, fico com uma
sensação de quero mais: tanto no sentido de querer acompanhar mais aqueles
interessantes personagens naquele ambiente, tanto em entender melhor o discurso
e as referências propostos pelo grupo.
Diego Molina (panodefundo@gmail.com)
Rio de Janeiro, 12 de novembro de 2014 – 7º Festival Niterói em Cena
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COM CERTEZA
Coletivo Lá vai Maria – Rio de Janeiro/RJ
“Com certeza” é uma cena adaptada
da peça “Tudo no timing”, do dramaturgo americano David Ives, transposta para o
palco do 7º Niterói em Cena através de elementos farsescos e com a presença de
uma charmosa banda executando a trilha sonora ao vivo.
O início da apresentação é
extremamente bonito. A banda, composta por três músicos, inicia os trabalhos
com um jazz, enquanto os dois atores terminam de se vestir e de compor seus
personagens. Sombras e uma luminária no palco marcam ainda o ambiente.
A estética, no entanto, é
dicotômica: a banda, a música e as sombras promovem um ar soturno e melancólico,
com ares de ambientação nova-iorquina. Os atores e as interferências sonoras
cômicas de uma espécie de corneta, que vem do palco, conferem um estilo mais
clownesco ao trabalho. A união, em si, não é ruim. A contradição dessas duas
linguagens promove uma estranheza esteticamente bem proveitosa.
O problema se dá justamente no
tratamento com o texto. A minha impressão é que todo o trabalho estético (a
concepção do esquete) acaba ficando maior do que a cena em si, superando o
propósito dela mesma: o encontro do casal. Ao começar pela disposição dos
elementos, que não favorece o trabalho: as cenas jogadas muito para o fundo do
palco, perdendo o contato com o público e dificultando a compreensão do texto,
e a não utilização do centro, a área mais nobre do palco, fixando os atores
totalmente do lado esquerdo e a banda do lado direito.
“Tudo no timing”, como o próprio
título diz, é um texto que depende extremamente do seu ritmo. Ao meu ver, ao
priorizar um tipo de composição clownesca de interpretação, os atores acabam se
prejudicando – e também a cena – na medida em que a velocidade e o ritmo dos
diálogos se arrefecem. O tempo dos diálogos e o jogo dos atores dá lugar, em
alguma medida, a uma necessidade de exteriorização dos trejeitos dos
personagens-clowns, deixando a cena maior do que o texto sugere. Da mesma
forma, um excesso de interferências da banda – apesar dela ser um elemento
válido e interessante – também atrapalha o andamento do texto.
Outras duas questões – fáceis de
se resolverem – é a presença da “corneta” na plateia, ao vivo, o que ocasiona
um “delay” desnecessário à cena (até que o som chegue ao final do palco,
perde-se bastante tempo); e a ausência dos elementos cenográficos sugeridos
pelo texto (mesa e cadeira).
Apesar dessas questões, trata-se
de uma cena com muitas qualidades, e em muito me lembra a áurea charmosa e
cosmopolita da trilogia “antes do amanhecer”, de Richard Linklater. Creio que
se o grupo conseguir casar seus anseios estéticos – tanto na concepção quanto
no trabalho de atuação – com o texto, o esquete vai crescer bastante.
Inclusive, clareando as questões propostas pelo autor e seu ponto-de-vista
sobre os relacionamentos nos dias de hoje.
Ps.: tenham cuidado com a cabeça
do ator, ao final da cena, quando vocês forem carrega-lo para fora do palco.
Hehehehe
Diego Molina (panodefundo@gmail.com)
Rio de Janeiro, 12 de novembro de 2014 – 7º Festival Niterói em Cena
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MEU NOME É ERNESTO!
Primitivos – Rio de
Janeiro/RJ
Um dos esquetes de maior êxito da
noite, “Meu nome é Ernesto!” tem um ótimo retorno do público por conseguir
realizar um trabalho bastante simples, mas recheado de nuances e profundidade,
intercalando momentos dramáticos e cômicos.
A receita desse êxito: a união de
três elementos, texto, direção e elenco de qualidade. Uma cena objetiva e
dirigida com simplicidade, focada em mostrar um pedacinho da vida de um casal de
idosos. Nesse sentido, a performance de Jéssika Menkel e Arthur Ienzura tem
papel decisivo na montagem. Ambos mostram técnica e desenvoltura na difícil
composição de seus dois velhinhos, se utilizando muito bem do tempo para
realizar suas funções. Apesar de apresentarem um estilo de representação um
pouco diferente, os dois atores, muito bem conduzidos pela direção, exploram
seus personagens com a calma dramática e o timing de comédia devidos.
Tanto a iluminação, quanto o
cenário e o figurino colaboram com o texto e com a encenação, sem excessos,
favorecendo o jogo dos atores e a objetividade das marcas.
Uma pequena ressalva à montagem
se dá no texto. Apesar de livremente inspirado na peça de Robert Anderson, a dramaturgia
parece mais uma cena recortada da obra original do que um esquete em si. Isso
porque muitas vezes o maior conflito do texto é mostrar os problemas físicos
dos idosos em detrimento a uma questão maior.
Mas se trata de uma cena
extremamente prazerosa e agradável de se acompanhar. Os personagens, com seu
tom debochado, nos convidam a embarcar na história sem enxergar o casal como um
mero objeto de piedade. A gag final da suporta morte do idoso fecha com chave
de ouro a apresentação. Um belo trabalho.
Diego Molina (panodefundo@gmail.com)
Rio de Janeiro, 13 de novembro de 2014 – 7º Festival Niterói em Cena
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UM LEÃO POR DIA
Clã de nós – Rio de Janeiro/RJ
Outro esquete com enorme comunicação
com a plateia, “Um leão por dia” é um trabalho divertido e executado com
competência pelos seus intérpretes. A dupla de atores-comediantes Bruna
Campello e Léo Castro, figuras bastante conhecidas do circuito de humor do
Estado, incorpora dois tipos muito engraçados, se utilizando de um timing preciso
e empatia com o público.
Apesar de construída a partir de
um mote já bastante visto em outros esquetes de humor – atores/figurantes
presos numa enrascada – a cena, escrita por Paula Rocha, lembra em muito os
entreatos do teatro musical, pois não carece de maiores recursos para uma boa
encenação e tem como objetivo principal o entretenimento. Nesse sentido, o
texto é bastante eficiente, apresentando com clareza um conflito/situação
dramática e uma plataforma objetiva para o desenvolvimento fluido da história.
Outro ponto positivo é o diálogo com elementos da atualidade, abordando
referências como programas de tevê e redes sociais.
O esquete também vai além do puro
entretimento na medida em que apresenta uma discussão válida sobre a
ineficiência do sistema penitenciário e de algumas convenções sociais, marcadas
pelos tipos representados – mesmo que superficial e dentro de uma estrutura
metalinguística (atores interpretando atores numa prisão).
Trata-se de uma cena dirigida com
agilidade (não sei se por Fernando Caruso ou Amanda Paiva, ou os dois – a ficha
técnica não esclarece), carecendo apenas de mais calma em alguns momentos.
Algumas pausas poderiam contribuir para o trabalho e para uma maior dramatização
da cena, no sentido de impor mais teatralidade.
Destaque ainda para a
participação em vídeo de Gugu Madeira, no papel do diretor do filme.
Diego Molina (panodefundo@gmail.com)
Rio de Janeiro, 13 de novembro de 2014 – 7º Festival Niterói em Cena
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HAMLET EM 15 MINUTOS
Os trágicos – Rio de Janeiro/RJ
O esquete é uma adaptação de um
trecho da peça “Dogg’s Hamlet”, de Tom Stoppard, e tem como proposta um mote
que já se tornou clássico: a apresentação de uma peça ou obra literária em
poucos minutos, com poucos atores e bastante humor. Trata-se de uma ideia que
já vem sendo realizada em muitos festivais de esquetes e em peças no mundo
inteiro. No Brasil, possivelmente a maior referência é o espetáculo “PPP@WllmShkspr.Br”,
dos Parlapatões de São Paulo, em que o grupo apresenta/conta/narra todas as
peças de Shakespeare em apenas 90 minutos.
A direção de Adriana Maia explora
bem a ideia, criando diversas cenas com agilidade e movimentação inventiva. A
escolha do elenco, utilizando-se apenas de atores homens – em referência ao
teatro elisabetano – também colabora com a dinâmica da cena e proporciona maior
exploração de recursos cômicos. Como elemento cenográfico, apenas um cortinado
preso a uma arara de figurino: outro artifício que favorece o ritmo do esquete.
Há ainda a presença de um músico na lateral do palco, que realiza intervenções
sonoras no decorrer do trabalho.
A interpretação dos atores aposta
numa criação mais farsesca. Trata-se de um elenco jovem e com grande disposição
física. O esforço em estabelecer contato com a plateia é um ponto positivo, mas
uma certa busca excessiva pela graça atrapalha um pouco o desempenho do elenco.
A utilização de alguns tipos e referências pop também me pareceu, em alguns
momentos, obscura. O sotaque nordestino e o francês, e a brincadeira com
Michael Jackson, por exemplo, não apresentam justificativa clara, dificultando
a comunicação com o espectador. O que pode ser um problema, na medida em que o
tipo necessita de uma identificação praticamente imediata para obter resultado.
As intervenções sonoras ao vivo,
mesmo sendo um bom artifício, poderiam ser melhor exploradas. O volume alto e o
fato do instrumento de sopro imitir um som um tanto agudo demais, também atrapalharam
o resultado do trabalho.
Já tinha ouvido falar na cena –
positivamente – e sabia que ela foi apresentada com 10 minutos de duração em
outro festival. Infelizmente, na transposição para o 7º Niterói em cena, esses 5
minutos me pareceram excessivos, tornando o esquete um tanto alongado.
Mas trata-se de um trabalho e de
uma pesquisa extremamente ricos, que explora em altos níveis a teatralidade e o
jogo cênico, e de contribuição relevante à prática teatral.
Diego Molina (panodefundo@gmail.com)
Rio de Janeiro, 13 de novembro de 2014 – 7º Festival Niterói em Cena
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NO PONTO
Acorda! cia. teatral – Rio de Janeiro/RJ
O esquete chama de cara a atenção
pela sua visualidade: cores fortes no cenário, luz, figurino e caracterização.
Essa estética acaba por dizer muito sobre o trabalho, marcado por
interpretações, movimentos e tons escrachados e debochados. No entanto, de
maneira geral, um pouco de suavidade e delicadeza seria bem-vindo à cena.
Também um excesso de músicas e pantomimas atrapalham o fluxo da cena e o ritmo
do esquete, que tem uma história, com início, meio e fim para contar. Ou seja:
tem um objetivo claro a ser perseguido, o que é uma qualidade.
Num primeiro momento, o texto se
mostra bastante instigante: de onde aquelas pessoas conhecem o protagonista
Greg? Mas a medida que a história evolui, sinto que ela acaba caindo numa
situação um pouco gasta: a ideia de que estão todos mortos.
O elenco trabalha num registro
clownesco – apesar de estranhamente só um ator usar o nariz de palhaço –
abusando de bufonarias e patifarias. Mas a busca excessiva pela graça não ajuda.
Uma observação: o uso demasiado do riso por parte dos personagens dá o efeito
contrário à plateia; é ela que deve rir, não os atores.
Acredito que um trabalho mais
rigoroso do clown, com menos variações vocais e menos movimentos, indo mais
direto ao ponto, ajudaria bastante o desempenho do elenco. Há que se trabalhar
a “seriedade” e as contradições do palhaço – base para a sua graça.
“No ponto” é um trabalho de um
grupo jovem, com muito vigor, mas ainda incipiente, e com uma válida
investigação sobre o humor, que deve ser trabalhada com técnica e deve ser bastante
incentivada.
Diego Molina (panodefundo@gmail.com)
Rio de Janeiro, 13 de novembro de 2014 – 7º Festival Niterói em Cena
***
QUANTO AO FUTURO
Rio de Janeiro/RJ
Trata-se de um monólogo com
direção e atuação de Ana Flávia Chrispiniano, a partir do romance “A hora da
estrela”, de Clarice Lispector. A atriz-diretora nos diz logo do que se trata o
esquete ao confessar: “Eu preciso falar sobre essa moça, senão eu sufoco”. E de
fato, vemos uma intérprete apaixonada por uma história, cheia de ideias e
energia, e ávida por nos mostrar seu trabalho, repleto de referências – como a própria
proposta de direção nos revela.
Mas o maior problema do trabalho
está justamente na falta de uma pessoa de fora para coordenar tantas propostas
e tanta disposição. Logo no início, por exemplo, o esquete se utiliza de uma
narração em off, ao meu ver não muito interessante e de certa maneira
desnecessária, pois se trata de um teatro narrativo. A utilização de offs em
cena é sempre delicada, ainda mais num trabalho que depende tanto da presença
da atriz em cena.
A atriz, com evidentes
qualidades, poderia se sair melhor se tivesse um diretor junto a ela,
selecionando e orientando o material que a atriz propõe. Pausas, silêncios,
volume de voz, delicadezas, o ritmo da cena, de maneira geral, tudo isso se
melhor trabalhado modificaria positivamente o resultado final, pois a cena
acaba ficando num mesmo registro quase que do início ao fim. Também
esteticamente a cena poderia apresentar mais recursos, iniciativa que fica mais
difícil quando o diretor está em cena. O momento em que a atriz come, por
exemplo, poderia ser melhor explorado – uma boa oportunidade para passar ao
público algumas sensações que o rico texto exala.
A quebra entre palco e plateia,
no início – um dos instantes mais delicados e honestos da cena –, é um ponto
positivo do trabalho, convidando o espectador a embarcar na história. Momentos
como esse, somados à potência da atriz, mostram que a cena tem bastante
potencial. Creio que um olhar de fora e a convergência do trabalho mais em
direção à construção de cenas dramáticas (performáticas) e de experiências, e
menos à contação da história, resultará num trabalho mais maduro e, inclusive,
mais autoral.
Diego Molina (panodefundo@gmail.com)
Rio de Janeiro, 14 de novembro de 2014 – 7º Festival Niterói em Cena
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O DOBRO
Embôa Companhia – Rio de Janeiro/RJ
O trabalho, do início ao fim, nos
propicia um belo deleite visual: som, luz, movimento, visualidade. Bonitas
imagens, repletas de cheiro e cor, ajudam o espectador a embarcar no mundo
criado pela dupla de artistas. Nesse sentido, a “viagem lúdica” que os
atores-autores-diretores Marcelo Cavalcanti e Luiza Mayall falam na proposta de
direção funciona bem. Mas assim como em outras cenas do festival, o acúmulo de
funções quase sempre traz alguns prejuízos ao trabalho.
O esquete, de maneira geral, me
parece mais apoiado numa estrutura lírica, com foco na visualidade e na
experiência sensorial. O texto, repleto de mudanças bruscas e cortes
excessivos, dificulta a transmissão da história e nos impede de ter uma empatia
maior com os personagens.
Também há um excesso de ideias em
cena, que acabam ficando soltas e prejudicam a unidade do esquete. Creio que um
melhor trabalho com o texto, selecionando os momentos mais significativos e aprofundando-os
– principalmente nos momentos dramáticos (teatrais, conflituosos) – darão mais
força à cena.
Há que se pensar também numa
variação de energia e estado das cenas do esquete como um todo, para que não
fiquem num mesmo registro. As dores e a profundidade do personagem do pescador
podem se acentuar se lhe for oferecido momentos de felicidade e prazer, para
que possamos ver mudanças. Um trabalho vocal mais rigoroso de projeção de voz
também é necessário, ainda mais num espaço em que a acústica é bastante
prejudicada.
De forma geral, fico com a
sensação de que gostaria de ver mais o trabalho do grupo, pois os bons momentos
que a cena propicia indicam uma pesquisa promissora, mas ainda em
desenvolvimento.
Diego Molina (panodefundo@gmail.com)
Rio de Janeiro, 14 de novembro de 2014 – 7º Festival Niterói em Cena
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