A FESTA NO CÉU
Gene insanno companhia de teatro – Rio de Janeiro/RJ
“A festa no céu” é uma adaptação
de Anilia Francisca a partir de um conto popular que fala sobre a perseverança
do “mestre sapo” em chegar ao céu para participar de uma festa com animais
alados.
A direção, também de Anilia,
imprime um ritmo frenético à cena, mas abusa das movimentações. Um pouco de
calma seria bem-vindo. Essa opção pela dinâmica da cena acaba sufocando a
própria contação da história, que fica confusa em alguns momentos. Nesse
sentido, a dramaturgia poderia ir mais direto ao ponto. Sinto, na verdade, a
falta de mais diálogos. A utilização demasiada da narração talvez não seja o
melhor caminho.
O elenco trabalha com uma mescla
não tão interessante de sotaques e abusa das modulações de voz, elevando o
registro da interpretação um tom acima do necessário. Mas percebe-se vigor e
disposição nos atores e atrizes.
A cenografia é bonita, mas
alegórica: não contribui tanto para o desenvolvimento da cena. Os figurinos são
coloridos demais. A trilha sonora estranhamente tem origens e produção diversas,
impedindo que uma unidade seja criada: há músicas gravadas, música ao vivo,
músicas cantadas e o repertório é um pouco eclético demais, tocando até Anita.
Mesmo conduzido num ritmo
acelerado o esquete acaba ficando um pouco longo. Isso se dá, além de tudo o
que foi dito aqui, em função de algumas brincadeiras repetitivas, como a ideia
de pular a cada vez que se fala a palavra “sapo”.
Trata-se de uma fábula rica e que
merece mais foco e simplicidade para ser contada. Do jeito que está,
infelizmente, o público não sente convidado a participar da festa, pois não
consegue acompanhar plenamente a história. O ponto positivo é o final da cena,
divertido e irônico.
Diego Molina (panodefundo@gmail.com)
Rio de Janeiro, novembro de 2014. 7º Festival Niterói em Cena.
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JUBAIA, O RECANTO DAS CORES
Grupo teatral LoucAtores – Rio de Janeiro/RJ
O esquete chama atenção logo no
início pelo fato de possuir trilha sonora ao vivo, executada por uma banda, mas
que fica posicionada fora do palco, na coxia. Não sei se isso é uma opção da
direção ou consequência de um eventual problema técnico no dia da apresentação.
De qualquer forma, é um desperdício.
O início do esquete talvez seja o
grande problema do trabalho. A história parece demorar para “pegar”. E ainda,
os momentos iniciais do trabalho têm sua compreensão prejudicada pelo excesso
de modulações vocais do elenco. Esse tipo de dinâmica, além de poder cair em
perigosos maneirismos de interpretação, diminui a força do trabalho porque
imprime uma estética e um registro de composição de personagem que ficam maiores
que os próprios personagens. Um jeito de falar repetitivo e previsível acaba
cansando o espectador, que pode desistir de acompanhar a cena. Objetividade e
menos “criatividade” nesse caso só tende a ajudar o trabalho dos atores e,
consequentemente, do esquete. A música inicial também dificulta a compreensão
do texto emitido pelos atores/atrizes.
A relação entre as cores e o
nordeste parece obscura no início, e somente do meio pro final captamos o
discurso proposto pelo texto. Um válido discurso, inclusive: o mote do
preconceito e da discriminação. A história, no entanto, acaba sendo contada
rápida demais, pois as cores logo aprendem a lição do esquete. Muito tempo é
perdido com outros momentos. Uma sugestão: vão direto ao conflito. E dificultem
o aprendizado das cores; fácil demais não faz sentido. Há que se trabalhar
ainda uma maior diferenciação dos personagens. A cor preta é quem apresenta um
destaque e uma personalidade realmente significativos.
Os melhores momentos do esquete
são o solilóquio da cor preta e a dinâmica com os guarda-chuvas.
Diego Molina (panodefundo@gmail.com)
Rio de Janeiro, novembro de 2014. 7º Festival Niterói em Cena.
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CONTANDO ROMEU E JULIETA
Oficina social de Niterói – Niterói/RJ
Apesar da história descrita na
sinopse ser um pouco diferente da apresentada em cena, “Contando Romeu e
Julieta” é um ótimo esquete, mostrando boa sintonia entre o texto, a direção e
o elenco.
A adaptação é um ponto positivo
do trabalho. Condensando os encontros do famoso casal da obra de Shakespeare e
se utilizando de dois confidentes (o rato e a ama), o texto consegue fluidez e
desenvolvimento dramático. Um respiro dentro de uma mostra em que o teatro
narrativo prevalece em detrimento ao diálogo.
Trata-se de uma cena divertida,
com uma direção bastante inventiva e dinâmica, e que investe proveitosamente em
uma referência: o filme “Moulin Rouge”, do diretor Baz Luhrmann. A inspiração
proporciona prazerosos e engraçados momentos musicados tomando como base músicas
brasileiras. O ponto negativo da direção fica a cargo das plaquinhas, que,
apesar de serem uma ideia interessante, acabam ficando apagadas no fundo do
palco, dificultando a leitura por parte da plateia.
O elenco está entrosado e embarca
na proposta da direção, com destaque para as duas atrizes – sem demérito do
elenco masculino, que também está bem. A ressalva se encontra no fato de que em
alguns momentos não é possível entender completamente o texto pela falta de
projeção da voz. Também alguns maneirismos vocais, por parte de um ou outro
ator, dificultam a compreensão do texto, pelo excesso de modulações.
Uma cena com boas ideias e bem
realizada, e que aposta – acertadamente – no desenvolvimento dramático da
história, muito bem contada.
Diego Molina (panodefundo@gmail.com)
Rio de Janeiro, novembro de 2014. 7º Festival Niterói em Cena.
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A CIGARRA, A FORMIGA E ESOPO
Companhia do solo – São Gonçalo/RJ
Um trabalho em que se destacam a
grande interação com a plateia e o trabalho musical. A cena, que se encaminha
mais para uma contação de história do que para um esquete teatral (sem juízo de
valor nesta observação), toma como base a conhecida fábula da cigarra e da
formiga. Porém, o autor Sérgio Caparelli tomou algumas licenças poéticas para
fazer diversas adaptações na história original, deixando o conto um pouco mais
contemporâneo e irônico. Outra qualidade do texto é o fato de que ele passa ao
público algumas informações sobre Esopo, proporcionando reflexões em cima do
próprio conto. Uma ressalva: infelizmente a história demora um pouco para
progredir. Talvez pelo excesso de repetições de algumas brincadeiras e pala
própria dinâmica com a plateia.
A direção da cena é bastante
simples e prioriza a dinâmica do “maestro” com o público – coisa que ele faz
muito tempo –, além de ter interferências precisas da atriz. Trata-se também de
uma cena com grande empatia com a plateia. Mérito da ótima dupla de atores
Gabriel Sant’Anna e Martha Paiva. A atriz, mesmo que com uma participação
reduzida, acaba chamando bastante a atenção com sua composição divertidamente
ranzinza da formiga.
No fim, o grupo convida o
espectador a relativizar e atualizar a “moral da história” dessa e –
consequentemente – de tantas outras fábulas, o que é uma contribuição relevante
para o teatro infanto-juvenil, ao meu ver.
Diego Molina (panodefundo@gmail.com)
Rio de Janeiro, novembro de 2014. 7º Festival Niterói em Cena.
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JOGO DA VELHA
Companhia Ávida – São Gonçalo/RJ
Esquete mais premiado da mostra
infanto-juvenil, “Jogo da velha” é uma agradável e inusitada surpresa. Num
festival em que se destaca o grande número de cenas com temática nordestina (o
que não é nenhum demérito) o esquete da Companhia Ávida chama a atenção pelo
trabalho a partir de um conto popular africano de autor desconhecido (aliás,
quem fez a dramaturgia?).
A visualidade do esquete é
bastante impactante. Um ser monstruoso e enraizado representa a morte e dois
atores pintados de um preto intenso são caracterizados como nativos africanos:
tabus e conceitos do teatro infantil “tradicional” são quebrados com essa
proposta, fugindo completamente do lugar comum, e não de forma gratuita, mas
com muita propriedade e ousadia.
Mas o esquete não começa bem. O
prólogo da morte acaba sendo um pouco longo demais – ajustes na dramaturgia são
necessários. A partir da interação entre os três personagens, a cena cresce
bastante. A sonoridade, as dinâmicas de luz e o movimento de cena são pontos extremamente
positivos, que aos poucos vão elevando a potência do trabalho.
O elenco é um destaque à
parte. Ivan de Oliveira, Kadu Monteiro e
Michael Alves apresentam grande disponibilidade e recursos corporais. Mérito
também da direção segura de Gabriel Mendes.
“O jogo da velha” não é perfeito.
Ainda precisa desenvolver algumas propostas que não estão cem por cento
“azeitadas”. O jogo com o tambor, a dinâmica das palmas, o tom de voz do elenco
– que às vezes vai para um lugar um pouco “teatral infantil” (no mal sentido)
demais, e o próprio prólogo – como foi falado. Mas a temática investida, a
visualidade, o ritmo e movimentação da cena e o trabalho em geral dos atores
deixam claro que é um esquete de extrema qualidade! Se aprimorados esses
pontos, o trabalho pode chegar a um nível sensacional!
Parabéns ao grupo pela pesquisa e
realização de uma cena relevante, pela abordagem do tema da morte junto ao
público infantil, e por ousarem (e conseguirem) sair do lugar comum.
Diego Molina (panodefundo@gmail.com)
Rio de Janeiro, novembro de 2014. 7º Festival Niterói em Cena.
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O VELHINHO E A MORTE
Creche na coxia – Cabo Frio/RJ
Uma das cenas mais premiadas da
mostra infanto-juvenil, “O velhinho e a morte” é um esquete ágil e dinâmico, que
toma um conto popular sobre “como enganar a morte” como base para sua
dramaturgia. Aliás, os dois grandes vencedores do festival (o outro é “O jogo
da velha”) tratam do mesmo mote.
A pesquisa do grupo a partir do
teatro narrativo mostra bons e inventivos resultados. Os atores se utilizam de
uma série de recursos para que a história seja bem contada, ganhando em ritmo e
criatividade. O elenco se propõe inclusive a se transformar em objetos
cenográficos.
A dramaturgia da cena está muito
bem desenvolvida e em consonância com a direção – talvez pelo fato de que ambas
são assinadas pela mesma pessoa, a competente Silvana Lima. A própria escolha
da fábula é acertada, pois se trata de uma história instigante e muito bacana
de ser trabalhada junto ao público infantil – saindo bastante do lugar comum. A
teatralidade obtida pela direção chama bastante a atenção e encanta os olhos do
público: tem até gente que voa! Em alguns momentos parecia desenho animado.
Trata-se de uma cena também muito
divertida. O uso do humor, aliás, é fundamental para que o assunto da morte
seja abordado de uma maneira acessível e leve junto às crianças.
Por fim, destaque para a qualidade
e disponibilidade de todo o elenco. Estão seguros e realizam as marcas e
movimentações com bastante precisão, e sem deixar de colocarem suas
características individuais. O grupo merece toda atenção e respeito.
Diego Molina (panodefundo@gmail.com)
Rio de Janeiro, novembro de 2014. 7º Festival Niterói em Cena.
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